Por onde canta o Ivo?

Ivo agora está livre da matéria e da dor, sua voz muito mais vibrante e seu humor mais ácido, acredito que exista lá, perto de uma estrela não muito quente, uma caixa de cerveja virada aonde ele se sentará e assistirá os seus melhores momentos, assim como fazia no Sinézio.

terça-feira, 13 de abril de 2010

Homenagem de Luiz Claudio Oliveira - Blog Sobretudo/Gazeta do Povo


Curitiba perdeu a voz


(Marcelo Elias/Arquivo Agência de Notícias Gazeta do Povo)
Ivo, em foto de 2007, durante ensaio com a Orquestra Sinfônica do Paraná para show de comemoração dos 30 anos do Blindagem


As vozes que anunciam as estações do Ligeirinho e do Biarticulado estão mais tristes. A voz que grita “Borboleta 13” na Rua XV está mais triste. Até as irritantes vozes amplificadas de farmácias e lojas populares parecem mais tristes. A voz do elevador anuncia os andares quase chorando. Curitiba perdeu "A" voz. A principal voz do rock curitibano não canta mais. Ivo Rodrigues, a voz que fez o rock nascer em Curitiba, morreu.

Foram 40 anos fazendo o povo cantar e sorrir com suas histórias alegres e malucas. Foi ele que abriu a chave para a entrada do rock na cidade e depois cercou-o com uma blindagem para que ninguém o roubasse. E o rock curitibano cresceu forte e teve inúmeros filhos.

Em alguma noite perdida na virada dos anos 70 para os 80, um adolescente imberbe presenciou em noites frias curitibanas ao mesmo tempo o fim da banda A Chave e o nascimento da Blindagem. Com alguns outros nomes de bandas pelo meio do caminho – até um incrível “Movimento Parado” – e um elo: Ivo Rodrigues. No início dos novos tempos, na transiçção de um para o outro uma atração musical era anunciada em cartazes como Ivo e Blindagem, o que já mostra o prestígio do cantor.

A Chave e a Blindagem são como lado A e lado B do mesmo LP (Long Play, um disco de vinil, para os mais novinhos). A Chave foi o início do rock curitibano, banda que fez sucesso aqui e no Rio de Janeiro (então a capital cultural do Brasil, nos anos 70), mas só gravou um compacto. Divergências naturais entre jovens criativos ligados ao sexo, drogas e rock’n’roll fizeram a banda dar um tempo. Não sem antes ficar marcada definitivamente na história musical paranaense.

Depois, veio a Blindagem, banda que está em atuação até hoje e qualquer pessoa com um mínimo de informação musical curitibana sabe de sua história. Ivo e Paulo Teixeira (guitarra) são os remanescentes da Chave no Blindagem. A banda nasceu poderosa fazendo shows em ginásios e festivais, dividindo o palco com grandes nomes da época, como Casa das Máquinas, Bixo da Seda, Tutti Frutti, entre outros.

Ivo levou para a Blindagem não apenas sua voz estrondosa, elástica e um tanto rouca. Também levou as composições em parceria com Paulo Leminski que foi, por um tempo, uma espécie de reserva de luxo, tanto da Chave quanto da Blindagem. Tempos criativos, em que a música não se isolava como arte, juntava-se a outras formas de expressão, como a poesia, as artes plásticas e o teatro. Dessa união nasceram dezenas de apresentações do Rock Horror Show, concepção do diretor Antonio Carlos Kraide, no Teatro Guaíra, um espetáculo roqueiro e anárquico que misturava música e teatro.

Na sequência, a banda fez apresentações em vários estados do país, lançou discos por grandes gravadoras e a história continuou. A banda, talvez pela primeira vez no Brasil, uniu bem o rock e o sertanejo, em parcerias de Ivo e Leminski que são cantadas até hoje. Foi a banda paranaense mais ativa no cenário nacional nos anos 80, anos que marcaram o fortalecimento do rock nacional.

Tudo isso seria possível sem o carisma e a voz de Ivo Rodrigues?

Não vou falar aqui de toda a carreira do Blindagem que até deve continuar, mesmo sem Ivo. Os trágicos últimos anos de sofrimento vieram preparando a banda para esta nova transição e a ela desejo boa sorte na caminhada.

Nos últimos anos, os excessos vinham cobrando sua conta do fígado de Ivo. Há dois, ele passou pelo processo de falência do fígado, resolvido com um bem sucedido transplante. No início deste ano, foi descoberto um câncer que atacou o rim do cantor. Foram dois meses de sofrimento para ele e a família. Deixa continuidade na música, pois o filho Ivan é um excelente baterista.

Mesmo passando por momentos difíceis e doloridos, Ivo nunca deixou de cantar. Ignorava recomendações médicas e aparecia de surpresa em shows em bares até quando aguentou. Já nesta última fase de sofrimento mais agudo, arrumava forças para cantar até no hospital, como relatou o filho Ivan, em um post no Twitter nesta semana.

Na noite desta quinta-feira, Curitiba perdeu “A” voz. Mas as canções de Ivo Rodrigues permanecerão para sempre.

O momento é triste, mas Ivo sempre foi uma pessoa alegre. Por isso deixo espaço para que amigos e admiradores contem aqui algumas das histórias incríveis de Ivo. Eu começo e vocês continuam.

Nos anos 80, no antigo Bar Bife Sujo, um guitarrista local que costumava “morder” os amigos, pedindo sempre um dinheirinho aqui e ali, se queixava para o Ivo que a vida estava difícil e que ele não tinha dinheiro nem para comer, que estava com fome. Ivo ouviu a história toda e, conhecedor da fama do amigo, disse que iria resolver a situação. Pediu para o guitarrista voltar ao bar no dia seguinte, que ele iria ajudar. No dia seguinte, no mesmo bar, o guitarrista esperava e Ivo apareceu. Então para resolver o problema da “fome” o cantor entregou ao amigo a solução: um moderador de apetite, que ele comprou na farmácia em frente.


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TRIBUTO AO ROCK PARANAENSE

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foto Ademir Gomes Jr